José
Manoel da Conceição nasceu em São Paulo, seis meses antes da
Independência do Brasil, em março de 1822. Mudou-se para Sorocaba em
1824 e foi educado pelo tio, o padre José Francisco de Mendonça.
Começou a ler a Bíblia aos 18 anos. Pouco depois, travou amizade com
uma família inglesa e várias famílias alemãs, todas protestantes, e
ficou impressionado com a vida religiosa deles.
Naturalmente
devoto, abraçou a carreira sacerdotal, tendo sido ordenado padre aos 22
anos. Exerceu o sacerdócio de 1844 a 1864, sempre na Província de São
Paulo: Monte Mor, Piracicaba, Santa Bárbara, Taubaté, Sorocaba,
Limeira, Ubatuba e Brotas. Os paroquianos gostavam muito dele. Por seu
apego à Bíblia e por sua simpatia aos protestantes, ganhou o curioso
apelido de “O Padre Protestante”.
Atraído
pela simplicidade do evangelho e pela Reforma Religiosa do Século XVI,
Conceição deixou o sacerdócio católico em setembro de 1864, dois meses
antes de o papa Pio IX publicar a encíclica Quanta Cura , que continha o famoso Silabo de Erros
– uma lista de 80 erros modernos que deveriam ser repudiados pelas
autoridades católicas, entre eles a total liberdade de culto e de
imprensa. Tornou-se membro da igreja Presbiteriana do Rio de Janeiro,
organizada dois anos antes pelo primeiro missionário presbiteriano a
vir para o Brasil.
Antes
de ser ordenado pastor evangélico em dezembro de 1865, há 130 anos,
Conceição dedicou-se à evangelização de seus amigos paroquianos em
Brotas, interior de São Paulo. Graças ao seu testemunho e a sua
pregação, os missionários pioneiros organizaram em Brotas a terceira
Igreja Presbiteriana brasileira.
A
conversão de Conceição mudou por completo o quadro e o avanço da obra
missionária protestante no Brasil. A dedicação dele a Jesus Cristo era
muito grande, e o seu ministério itinerante era muito bem sucedido. Ele
ardia de paixão pelas almas perdidas e pelos excluídos. Conceição tinha
um temperamento muito especial. Não era capaz de ficar parado atrás de
uma mesa, de gastar tempo com a organização eclesiástica, nem de
assumir um pastorado fixo. Não se sentia atraído pelos grandes centros
urbanos nem por pessoas bem vestidas. Era um incorrigível pregador de
vila em vila. Hospedava-se em qualquer lugar e não se aproveitava de
ninguém. Pregava, curava e desaparecia sem mais nem menos. Às vezes,
deixava um bilhetinho, agradecendo a hospedagem ou dizendo que tinha
ido embora. Nunca dizia para onde, porque ele mesmo não tinha um
itinerário antecipadamente traçado. Viajava, a pé, distâncias enormes,
às vezes de uma província para outra. Comia pouco e se contentava com
qualquer comida. Sofria pressões do clero católico. Não poucas vezes
era expulso de uma vila, ameaçado de morte, chamado de apóstata,
anticristo e até de pastor louco.
Conceição
era de uma simplicidade incrível, não obstante fosse muito preparado:
sabia comunicar-se com os estrangeiros em suas próprias línguas,
traduzia livros do inglês, do francês e do alemão, e tinha noções de
medicina. Chegava a se vestir mal, roupa surrada demais. A herança que
recebeu da família foi toda distribuída com obras de beneficência.
Preocupava-se demais com os outros e muito pouco consigo mesmo. Embora
desimpedido do voto do celibato por ter se desligado de Roma, o Padre
José, como era chamado, nunca se casou, e sua pureza de vida sempre
estava fora do alcance de qualquer maledicência. Não era servil aos
missionários americanos, não obstante ser o único obreiro nacional no
meio deles. Por causa de sua experiência na Igreja Católica, morria de
medo de uma igreja excessivamente organizada. Realizava um ministério
diferente dos missionários, e o seu trabalho era o que crescia mais.
Conceição sonhava com um movimento profundo de reforma nos sentimentos
e experiência religiosa do povo, aliado ao esclarecimento bíblico, que
tornasse possível a criação de um cristianismo brasileiro puro e
evangélico, mas enraizado nas tradições e hábitos populares.
Conceição
gastou vinte anos como sacerdote católico (dos 22 aos 42 anos) e oito
anos como pastor protestante (dos 43 aos 51 anos). Morreu no dia em que
mais uma vez se comemorava no Império do Brasil e do mundo inteiro a
encarnação do Verbo, a 25 de dezembro de 1873. Morreu dormindo, na
Enfermaria Militar do Campinho, no Rio de Janeiro, depois de ser
atendido por um médico e um farmacêutico e depois de pedir para ficar a
sós com Deus. Mas seu corpo está sepultado ao lado do fundador da
Igreja Presbiteriana no Brasil, o missionário Ashbel Green Simonton, no
Cemitério dos Protestantes, anexo ao Cemitério da Consolação, nas
proximidades do Hospital das Clínicas, em São Paulo. Na lápide de
Conceição está gravado: “Não me envergonho do Evangelho de Cristo”.
(Extraído do livro Entrevista com Ashbel Green Simonton, Editora Ultimato, págs. 43-46)
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